quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Tadieu Bône


. Eram sonhos na possibilidade remota de ser. 
Ela acordara durante a única noite que ousara dormir. Tentativa ilusória de tentar ser.
Mudava as paredes dos quadros. Repintava-os no espelho.
A memória que gritava ausência o fazia seguir. E por instantes seguiu sendo. Aquilo que (mesmo por instantes) precisava ser. Eram claras. As objeções. Todas elas eram.
Fechou os olhos par de vezes tentando invadir o que estava de errado naquele espaço. Foi feliz e gritou ambas vezes no mesmo instante.
Floreou toda a casa. Toda casca. Colorida buscava não se sabe o que pra entender que o espaço não era aquele. Sentia. Ou tentava. Buscava na ausência o ponto de apoio exato. Ainda acreditando em tudo aquilo. Tudo existia. Eram prospectos da sua mente perturbada. Ela via coisas erradas distintas e se calava a cada uma delas. Era prisioneira das suas próprias responsabilidades e estava cansada de ventar a cada manhã. 
Buscava aos berros o silêncio, que rebatiam de forma aguda aquele sentimento perdido. Poucos. Mas ensurdecedores. Indaga veementes os olhos. Os via estranhamente distantes. Fechava-os com agressividade. Os pontos estavam perdidos. E. Ela roucamente imprimia essa vida que não era sua. 
Via. Contorcia vozes intermináveis que a mandavam fugir. Fingia.  A voz. As vozes. Todas elas. No sonho passado era sangue. No de hoje. Até de olhos abertos via sangue. De um vermelho podre. Segurava disformes os restos mortais daquilo que ainda eram ossos. Fedia.
Saudade era isso. Dor e volúpia. Palavras e línguas das quais não se entendia. Absolutamente. Nada. A espera.
A voz dizia pra fugir. A insegurança. A falta de acreditar do outro se entendia como principal causa em seu corpo. Sangrava.
Reinventava as cores que saiam do seu corpo, transformando em novas cores. Rodava em círculos expulsando e exploração que rondava seu corpo. Gritava a algum deus para buscar gloria. Rodavam sem sentidos. Todas conectadas. Cores vivas. Cores sadias. Fortes. Conformes. Umas rondavam as outras. A terra. O ar. A água. Tudo aquilo que fazia parte daquilo que sentia.
Pulou a linha de onde saberia sobre ele. Ela se perderia naquela dança extasiada. Ele se jogou. Extasiado. Sem uma gota do que qualquer que fosse. Só a musica o invadia. Pintava o que sentia. Sentia.
Exasperado. Cansado. Misturou-se num banco qualquer. Do nada. Buscando dessa vez o vazio pra dentro. Eloquentemente diferentes de todas as outras tentativas. Foi feliz ao sentir por instantes a luz do sol em seu corpo. Depois. Depois.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O eu do outro.


Eram redondos e profundos os olhos. Quase que inabitados. Eram ausentes.
Sentiu calafrio esperando ventar.
Os dedos dele percorriam face às minhas ancas. Eram dedos libidinosos que se escorregavam nuca abaixo. Perdidos.
Os dedos do outro percorriam sua face, tentando entender até onde aqueles traços apaixonantes o levariam. Sentiu medo. Tremia. E nada aconteceu.
Os dedos. Ele. D’Eles.
Preferiu a fuga. Nunca admitiria ausência.
Cansado, indagaria tristeza. Colocaria culpa no clima quente que lhe afagava a pele.
Eram todos diálogos desconexos numa espera mutua que jamais os levaria a algum lugar.
Ele achava que o outro sentia demais. De fato sentia. Sentira. Vai sentir. Eram ausências e presenças misturadas no mesmo diagrama. O toque de forma inesperada. Num gesto onde não se sabe onde vai chegar.
O outro é realista nas palavras. Mas as mesmas se perdem ao expressar daquilo que sente.
Sentia algo como medo e insegurança. Mas deixava de sentir quando mais precisava.
Juntou os cacos espalhados pelos cantos esquecidos. Juntou todos. Espalhou em outro novo canto qualquer. Canto esse, que logo seria a base para um novo esquecimento. Sentiu. Sentiu. As lagrimas ardiam-no os olhos. Mas não caíram.
O sono repartido tentava cegá-lo. Era inutilmente vasto. Mergulharia dentro de si para encontrá-lo quantas vezes fosse preciso. Algo dele ainda haveria de estar por lá.
Levantou. Ergueu-se daquilo que ousara chamar de raiva. Numa tentativa frustrada de fingir que não haveria amor. Mas tinha. De amor. Viveu. E de amor. Vive. Por amor. Sentiu. Pela busca. Tentou ser. Tentando ser. Invadiu. Invadindo. Perdeu-se.
Meio como quem tromba nas próprias pernas. Travestiu-se de coragem e foi enfrentar-se junto ao espelho. Gritaram-se. O eu de dentro e a casca. Não se entendiam. Definitivamente. O eu de dentro era emoção demais. A casca despida de afeto feriu. Aquilo que o outro chamaria de amor.
Eram palavras. Construções. As cenas estavam todas preparadas. Embora o protagonista. Embora.
Enxugou o que o outro chamaria de lagrima com as mãos que o ousara tocar. Desmediu-se entre o lençol desbotado e tentou ser.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Razões


Mãos ásperas. Precisas. Como se tocassem a si próprio. Dentro do eu do outro. 
O corpo reagindo contrario ao toque das mãos que permaneciam coladas no pescoço. Contorcia-se todo. Como se não houvesse mais espaços inabitados. Precisas, contornariam aquelas curvas sutis, redesenhando-a toda, de uma forma grave e desalinhada.
Olhos que se abraçavam ininterruptamente. Inevitável. Sorriram. Gritaram. Trocaram-se intensamente.
Eram olhos redondos e ardentes. Fugaz, como quem deseja. Mas incompreensível como quem vive.
Eram pedaços inteiros cortados e colados na medida certa daquilo que precisava. O brilho deles. Esse eu jamais hei de esquecer.
Pela segunda vez encontrei o primeiro olhar, como quem estava perdido em seus próprios atos. Durou o instante que tinha pra durar e ventou.
Encontrei seus lábios cítricos poucos segundos depois. Misturados de essência e medo. Eram passos largos, como os de quem pudesse alcançar o âmago com as próprias mãos.
Sorriu. Dessa vez de medo. Numa tentativa inútil de não sentir ausência. Aquilo que segundos atrás se transformara em seu inferno. Perdeu-se em seus próprios passos numa noção de tempo perdido. Sabia que estava vivo e aquilo bastava. Jogou-se, como quem se esparrama, meio de lado. Sentiu as pernas. Os braços. E o vento não balançou o cabelo.
Partiu e não olhou pra trás. Eram passos de medo. Como os de quem rastejava por não saber o amanhã. Baseado nos segundos de paraíso que pudera observar dentro daquilo que era o seu inferno.
Não foi tocado nos lábios com voracidade. Sua mente vagava pelo limbo que criara há instantes. Lá onde não pode se vir nos olhos dele. Calculou assimetricamente os anseios do outro e mergulhou. Sabia que iria se encontrar. Era tudo questão de tempo. E o medo fazia com que parecesse uma eternidade.
Olharam-se de forma a fugir um do outro. A essência fora perdida. E por instantes eternos não se encontraram um nos olhos do outro. Como quem busca a paz atrelaram-se os dedos. Numa medida de buscar bruscamente a raiz daquilo que causava a dor.
Ouvi seus gritos e arrepiei-me todo. Despi-me por completo, a fim de encontrar a semente que gerava aquela sensação oca extasiada no céu da boca. Não pude enxergar estrelas, nem nada. Mas o conforto veio por instante quando lembrei o seu rosto clareado pela vasta lua que nos seguia.
Dopei-me dessa insegurança toda. Fiz caretas no espelho numa tentativa inútil de o ser. Fui, durante segundos, aquilo que nunca ousei ser. Fervi meu corpo e com lâminas me cortei. Sangrava por dentro. Gangrenada. Cuspi no chão todo o desequilibro sentido. Misturei todas as essências ao alcance dos olhos e ventei. Chorei por segundos a paisagem opaca e embaçada dos olhos e não ousei gritar.
Abaixei a cabeça na calçada sem ladrilhos e por lá fiquei. Senti um peso nas costas e alívio nas mãos. Buscava-o nas entrelinhas. Havia tanto e nada pude enxergar. Deixaste-me cego. Fechei os olhos na tentativa de fazer com que aquilo passasse. Nada, que nada. Clarice me diria, sem rodeios, que o obvio saiu do meu âmago e que algo parecia florescer dentro de mim. Eram tulipas de todas as cores. Despedaçadas. Vivas. Comiam-me por dentro. Saciaram-se do que antes era o eu.
Abri os olhos. Arregalei-os. Busquei. A claridade invadia. Ceguei-me. Abri os braços. Não havia. Procurei-o por toda parte e não pude o sentir. Lembrei-me do texto da porta. Ela tinha razão quando pariu. “Permito que você tome meu corpo em seus braços e que suas mãos agarrem meus cabelos.” E nada aconteceu. Abri a caixa com a única coisa concreta que havia. Mãos trêmulas. Desfocadas. Tentando ir ao âmago. Deixava, portanto, se evadir.